"Leve o raminho que é para dar sorte"
anuncia a mulher de traje preto nas Amoreiras, nas barbas do fisco.
"São só dois éurios", remata.
Abordei-a perguntando-lhe porque estava a vender o mal enjorcado ramo e ela foi-me explicando que há que fazer pela vida, que a coisa está difícil, que lhe cortaram o subsídio (sem dizer qual), que o Sócas é um malandro, enfim, o rosário habitual das lamúrias de quem, mesmo quando está na rua a vender para os funcionários do fisco, não passa recibo, nem paga imposto.
A realidade portuguesa contada à laia de pregão.
Quanto ao ramo, à Quinta-feira da Espiga, à Quinta-feira da Ascensão, ao Dia da Hora, ao quadragésimo dia após a Páscoa, à última aparição de Jesus aos Apóstolos, ao sagrado da coisa ou ao profano do símbolo do ramo de oliveira, do alecrim, das papoilas e malmequeres e da própria espiga, nada me disse, nada sabia nem queria saber.
Bastava-lhe conhecer que o ramo tinha de se guardar atrás da porta até ao ano que vem, altura em que voltará à rua para vender, em mercado paralelo, um ramo que pouco valor tem porque, para o ter, deveria ser colhido no campo, ao meio-dia – hora em que tudo pára – pelos próprios que querem ser abençoados com as graças de não lhes faltar o pão da espiga, o azeite da oliveira e a alegria das flores silvestres.
Passamos a vida a tentar fundamentar com grandes e sábias teorias o estado a que chegámos e afinal tudo é tão simples, tudo se resume à mulher de traje negro nas Amoreiras a apregoar ignorância aos incautos, enquanto engana o Estado, isto é, a todos nós e se lamuria com as maldades que os outros cometem.
LNT
[0.201/2011]
anuncia a mulher de traje preto nas Amoreiras, nas barbas do fisco.
"São só dois éurios", remata.
Abordei-a perguntando-lhe porque estava a vender o mal enjorcado ramo e ela foi-me explicando que há que fazer pela vida, que a coisa está difícil, que lhe cortaram o subsídio (sem dizer qual), que o Sócas é um malandro, enfim, o rosário habitual das lamúrias de quem, mesmo quando está na rua a vender para os funcionários do fisco, não passa recibo, nem paga imposto.
A realidade portuguesa contada à laia de pregão.
Quanto ao ramo, à Quinta-feira da Espiga, à Quinta-feira da Ascensão, ao Dia da Hora, ao quadragésimo dia após a Páscoa, à última aparição de Jesus aos Apóstolos, ao sagrado da coisa ou ao profano do símbolo do ramo de oliveira, do alecrim, das papoilas e malmequeres e da própria espiga, nada me disse, nada sabia nem queria saber.
Bastava-lhe conhecer que o ramo tinha de se guardar atrás da porta até ao ano que vem, altura em que voltará à rua para vender, em mercado paralelo, um ramo que pouco valor tem porque, para o ter, deveria ser colhido no campo, ao meio-dia – hora em que tudo pára – pelos próprios que querem ser abençoados com as graças de não lhes faltar o pão da espiga, o azeite da oliveira e a alegria das flores silvestres.
Passamos a vida a tentar fundamentar com grandes e sábias teorias o estado a que chegámos e afinal tudo é tão simples, tudo se resume à mulher de traje negro nas Amoreiras a apregoar ignorância aos incautos, enquanto engana o Estado, isto é, a todos nós e se lamuria com as maldades que os outros cometem.
LNT
[0.201/2011]