Voltemos então à ruralidade. Voltemos ao campo, ao interior, à couve portuguesa, ao caldo verde, aos passarinhos que, tão engraçados, fazem os ninhos com mil cuidados.
Voltemos ao xisto, ao granito, ao minifúndio, à vinha da uva morangueira euro-proibida.
Voltemos, mas só de férias porque no labor sejamos urbanos, litorais, bronzeados, com mansões de ripanço viradas a Sul, ao mar e ao Sol, rodeados de amigos-sócios-companheiros, com uma ou outra figueira ou alfarrobeira para recordar a ruralidade da infância, a lavoura de subsistência, a dependência dos merceeiros que compram os produtos da terra abaixo do valor do adubo e os transaccionam no lucro. Intervalemos a monotonia da contagem de notas que a aplicação financeira promoveu com a pastorícia de um qualquer dez de Junho.
Voltemos à lavoura, à desmatação da cortiça, ao negócio da lata, à exploração transgénica, ao bucólico e à caça aos melros nos jardins de um palácio do Estado feito sede de poder, à mão de semear de uma canhoeira que se alinhe no Tejo.
Ou então naveguemos no mesmo mar que nos trouxe ouro e especiarias que estoirámos com a mesma displicência com que derretemos os milhões oferecidos pelo continente que nos abriu as fronteiras quando desfizemos o Império e devolvemos aos seus indígenas as terras padroadas a ferro e fogo.
Fiquemo-nos pela nossa intrínseca ruralidade, agora quase todos doutores, com tiques urbanos, com a tronchuda numa mão e na outra as rédeas de uma azémola que nunca soubemos conduzir mas que, por sermos broncos que renegam o saber da raiz e não se desenvolvem nas luzes, fazemos precipitar a Nação no destrutor de quem muito se engana por nunca ter dúvidas.
LNT[0.230/2011]