De novo sexta-feira, dia da semana programado para higiene e balanço de caixa na barbearia.
As receitas continuam diminutas, embora a troika já tenha desligado o relógio do(as) Caldas. A clientela que felizmente continua a não faltar e que cada vez mais se diversifica aparecendo de precedências nunca vistas, mantém o hábito de pedir, no fim de cada função, que acrescente o valor do corte ao rol dos calotes.
- Isto continua sem saldo e, do pouco que recebo, um quarto vai directo para a almofada do Coelho - desabafa o Sr. Luís frustrado por não conseguir pecúlio bastante capaz de reempregar uma ou outra colaboradora que anime a malta e a descontraia enquanto lhes cerceia os topetes.
Perdido na limpeza das navalhas e no afiar dos outros instrumentos de corte, o barbeiro alertado por um seu concorrente, procurou a tesoura usada no último corte e confirmou que estava romba, o que poderá ter provocado alguma dor durante o aparo e penenticia-se:
- Talvez devesse ter usado outra tesoura, alguma mais afiada mas de menores dimensões, mas foi aquela que estava mais à mão. Tenho de ter mais atenção até porque há clientes que não merecem sacudiduras por mau estado das ferramentas. Quando o homem cá voltar hei-de dar-lhe uma palavrinha. Com isto foi buscar o rebolo e amolou a tesoura deficiente.
Entretanto na rádio cantava o Carvalho do depois do adeus. O Sr. Luís, que a sabia de cor, trauteou-a com saudade e sentimento:
- E depois do adeus e depois de nós, lá, lá, rá, lá, lá. – e voltando ao pensamento anterior - Mas, chiça, o tipo com aquelas coisas dos costistas irritou-me porque parecia não perceber que isso não existe (para além dos do Castelo, freguesias adjacentes e mais uns quantos “complacentes” ou “distraídos”, como dizia o outro), assim como não haviam assististas, conforme o próprio percebeu logo que perdeu o concurso de há três anos. O que há são outros “istas” à procura de testas de ferro. Quando o cliente retornar hei-de desbastar com mais precisão evitando o repelão - Concluiu, arrumando.
LNT
[0.281/2014]
Imagem: http://www.gutenberg.org/
As receitas continuam diminutas, embora a troika já tenha desligado o relógio do(as) Caldas. A clientela que felizmente continua a não faltar e que cada vez mais se diversifica aparecendo de precedências nunca vistas, mantém o hábito de pedir, no fim de cada função, que acrescente o valor do corte ao rol dos calotes.
- Isto continua sem saldo e, do pouco que recebo, um quarto vai directo para a almofada do Coelho - desabafa o Sr. Luís frustrado por não conseguir pecúlio bastante capaz de reempregar uma ou outra colaboradora que anime a malta e a descontraia enquanto lhes cerceia os topetes.
Perdido na limpeza das navalhas e no afiar dos outros instrumentos de corte, o barbeiro alertado por um seu concorrente, procurou a tesoura usada no último corte e confirmou que estava romba, o que poderá ter provocado alguma dor durante o aparo e penenticia-se:
- Talvez devesse ter usado outra tesoura, alguma mais afiada mas de menores dimensões, mas foi aquela que estava mais à mão. Tenho de ter mais atenção até porque há clientes que não merecem sacudiduras por mau estado das ferramentas. Quando o homem cá voltar hei-de dar-lhe uma palavrinha. Com isto foi buscar o rebolo e amolou a tesoura deficiente.
Entretanto na rádio cantava o Carvalho do depois do adeus. O Sr. Luís, que a sabia de cor, trauteou-a com saudade e sentimento:
- E depois do adeus e depois de nós, lá, lá, rá, lá, lá. – e voltando ao pensamento anterior - Mas, chiça, o tipo com aquelas coisas dos costistas irritou-me porque parecia não perceber que isso não existe (para além dos do Castelo, freguesias adjacentes e mais uns quantos “complacentes” ou “distraídos”, como dizia o outro), assim como não haviam assististas, conforme o próprio percebeu logo que perdeu o concurso de há três anos. O que há são outros “istas” à procura de testas de ferro. Quando o cliente retornar hei-de desbastar com mais precisão evitando o repelão - Concluiu, arrumando.
LNT
[0.281/2014]
Imagem: http://www.gutenberg.org/
3 comentários:
Dizia um grande estadista e cito de memória que "Vivemos todos sob o mesmo céu, mas nem todos temos o mesmo horizonte"...não invejo o seu, sinceramente, eu que caminhei descalço na minha infância, nem lhe cobiço o génio. mas é apenas uma opinião...
Todos, em alguma altura da nossa infância, andámos descalços. Mas nem todos conseguimos em adultos poder brincar com Macintosh's. Há quem nunca viva acima das suas possibilidades, é o que é.
Esqueci-me também de dizer também que todos nascemos nus. Não posso citar o autor desta maravilhosa constatação mas deve ter sido alguém muito conhecido das letras e das artes.
Enviar um comentário