quarta-feira, 18 de abril de 2012

Miúdos

Mafalda


A miúda que acompanhava a mãe ao emprego naquele dia de carnaval em que os filhos não tinham aulas mas que, porque parecia bem lá fora, o governo tinha mandado os pais trabalhar, espantou-se com o êxodo que contrariava a entrada às oito e trinta da manhã e perguntou-lhe:
- Porque é que, no seu emprego, os do "turno da noite" são pretos?
A mãe incomodada com a constatação conseguiu dar a volta:
- Não é por serem pretos, filha, é porque estas senhoras não têm estudos. Sabes que há uns anos atrás os do "turno da noite" em França e na Alemanha eram quase todos portugueses brancos?
A miúda ficou em silêncio até o elevador abrir as portas no décimo quarto piso. Já no átrio, quase a seguir viagem para cima, ouvi a miúda perguntar à mãe:
- Porque é que a mãe, que já tem os estudos, vem trabalhar hoje se eu, que estou ainda a estudar, não tenho aulas?
LNT
[0.220/2012]

Chamamentos

João CutileiroA TMN lançou uma campanha optimista da série que foi iniciada futebolisticamente, há uns anos, por um brasileiro que dirigiu os nossos rapazes da bola.

Felizmente a campanha "Portugal está a chamar" não é da autoria da EDP senão teríamos a percepção de que nos queriam de novo em Macau mas desta vez navegando por um mar de pentelhos, como diria o negociador da troika que agora alterna energia positiva com o gozo dos figos marafados da Coelha.

"Portugal está a chamar" é um hino. Faz lembrar as bandeiras nacionais estampadas de quinas chinesas penduradas nas janelas de todos os pacóvios que se convenceram que iríamos, já naquela altura, vencer a Grécia e que, depois de tanto peito cheio, acabaram por perceber que os gregos, mesmo em cuecas, conseguiam ter melhor jogo avançado do que nós.

"Portugal está a chamar" é um desalento. Imagino, penso eu e muitos outros, que está a chamar a esta malta que nos espreme aquilo que os portugueses lhe vão chamando nos autocarros, nas conversas de rua e em cada multibanco onde se pede um saldo de conta.

"Portugal está a chamar" é um sofrimento. É a confirmação de que Portugal não são os portugueses e que o chamamento é para o indefinido, para o "Vamos Lá". Chama porque sim, parece a morte a reclamar as almas ou os centros de emprego a enviar-nos para a caridadezinha de uma associação benfazeja.
LNT
[0.219/2012]

Já fui feliz aqui [ MCV ]

Torquato da Luz
Torquato da Luz - Espelho Íntimo - Portugal
E assim vamos gastando os dias em novelos e ninharias.
LNT
[0.218/2012]

terça-feira, 17 de abril de 2012

argumentum baculinum [ I ]

Cobra leiteOs portugueses são um povo indeciso.

Quando tinham um Salazar diziam (baixinho) que o que isto estava a precisar era de liberdade.
Quando tinham liberdade diziam (a bandeiras despregadas) que o que isto estava a precisar era de um Salazar.
Agora que têm aquilo que merecem dizem (entre dentes) que o que isto está a precisar é que abra a caça aos láparos.
LNT
[0.217/2012]

Surdinas [ XLIII ]

Mosca(baixinho para que ninguém nos ouça)

Vasco Graça Moura disse ontem na Buchholz o poema que escreveu a Alegre na sequência da leitura que fez no fim-de-semana.

Fica o registo nesta série para que em surdina fique:
Manuel Alegre deu o dito por não dito
quando escreveu "nada está escrito"
(e eu repito)
nele, o poema é o som e o sentido
de um problema vivido
(e eu não duvido)
voz que afirma ou nega à tona e no fundo,
joga à cabra-cega e desvenda o mundo
(e eu o secundo)
voz que entrelaçou o feio e o bonito,
o mais chão, o voo, o não dito e o dito
(e eu acredito).
LNT
[0.216/2012]

A formiga no carreiro *

Escher MobiusNão é por não tentar que não consigo chegar onde é preciso. Sou baixote (metro e setenta e dois), talvez seja por isso, porque de resto tenho-me esticado o quanto posso mas a cepa torta anda sempre por aí.

Já fiz de tudo, quase tudo, já fui pimenta e canela, já voei, já escrevinhei basto (olá tripeiros), já dei electrónica a muita besta que nem palha merecia, já comi o pão que o diabo amaçou e também comi papa de urso de bufos e brutamontes. Já dei muito petisco, convencido de ser verdade o que dizem para quem arrisca.

Mas não consigo chegar onde é preciso. Não que não tente, porque vou tentando, mas talvez por ser fracote (para aí uns setenta quilos).

Aquele velho que pinta quando não chove, continua a dormir no mesmo sítio, os miúdos que já nem pedem na rua continuam a ter fome, o outro que me respondia sempre: - "lá vou andando" – deixou de andar.

Fico para aqui de teclas na mão, vou tentando. Nunca mais chega Abril, pois não, *Zeca?
LNT
[0.215/2012]

Falta metade para um milhão

Chaplin


Olho para o contador, que nesta casa conta calmamente e sem batotas nem graxas, e apercebo-me que estão (quase) a só faltar 500.000 para que se atinja um milhão de clientes. É espantoso para quem abriu o estabelecimento há quatro anos e picos e só tem uma tesoura para desbastar tanta trunfa e topete.

Lançando o barro à parede, espero que apareça um patrocínio alemão para que o cliente 500.000, caso se identifique e comprove ser o bafejado, receba uma barra de ouro achocolatado com a chancela de Merkel.

Quanto aos restantes 499.999 que por aqui passaram, ficam beijos e abraços.
LNT
[0.214/2012]

Já fui feliz aqui [ MCIV ]


Elefante
Elefantes - Gorongosa - Moçambique
Para os saudosos, seguir por aqui
LNT
[0.213/2012]

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Bolas de cristal

Bola de CristalConfrontado com a percepção de que já todos sabemos das falsidades emanadas do Governo e com o incumprimento de todas as suas promessas eleitorais, escudado num acordo de resgate por si exigido e que aos poucos transforma em coisa diferente da que foi negociada (e onde o PSD teve papel determinante) por um Governo em gestão sem alternativa, depois de ter visto derrotado por todos os Partidos representados na Assembleia da República e pela indiferença do Presidente da República uma proposta de solução apresentada pelos nossos parceiros europeus, Passos Coelho entrou agora na fase do não comprometimento.

O homem não sabe que quando se traça um projecto há que definir metas e nem sequer imagina que entre os instrumentos para previsão dos resultados de qualquer plano existem indicadores da evolução dos riscos assumidos, existem medidas de mitigação desses riscos e têm de existir planos de salvaguarda para o caso das ameaças passarem a configurar constrangimentos.

A triste figura que um decisor político (ou qualquer gestor) faz ao não se comprometer com metas para obtenção dos resultados é confrangedora. Tem sido essa miserável condição que levou o País à situação em que se encontra.

Ouvir Passos Coelho dizer que não se compromete porque não tem uma bola de cristal é compreender que andamos à deriva e que todas as medidas até agora tomadas mais não são do que um conjunto desgarrado de miserabilidades destinadas a ganhar (passar o) tempo, como se o tempo esgotado fosse algo que se ganhasse.
LNT
[0.212/2012]

Já fui feliz aqui [ MCIII ]

Casa Férias
Ericeira - Portugal
LNT
[0.211/2012]

domingo, 15 de abril de 2012

Tudo por escrever

Nada está Escrito
Balada dos Aflitos

Irmãos humanos tão desamparados
a luz que nos guiava já não guia
somos pessoas - dizeis - e não mercados
este por certo não é tempo de poesia
gostaria de vos dar outros recados
com pão e vinho e menos mais valia.

Irmãos meus que passais um mau bocado
e não tendes sequer a fantasia
de sonhar outro tempo e outro lado
como António digo adeus a Alexandria
desconcerto do mundo tão mudado
tão diferente daquilo que se queria.

Talvez Deus esteja a ser crucificado
neste reino onde tudo se avalia
irmãos meus sem valor acrescentado
rogai por nós Senhora da Agonia
irmãos meus a quem tudo é recusado
talvez o poema traga um novo dia.

Rogai por nós Senhora dos Aflitos
em cada dia em terra naufragados
mão invisível nos tem aqui proscritos
em nós mesmos perdidos e cercados
venham por nós os versos nunca escritos
irmãos humanos que não sois mercados.
Manuel Alegre
Manuel Alegre apresenta "Nada está escrito", o seu mais recente livro de poesia.

Será amanhã, dia 16, pelas 18:30, na Leya, em Lisboa, Rua Duque de Palmela, 4.

Lá estarei para me juntar à oração à Senhora dos Aflitos. Pode ser (embora pouco crente) que nos ajude a sair desta agonia que transforma seres humanos em escravos dos "mercados".
LNT
[0.210/2012]

Creiam, crentes

Coelho Ama-teAo contrário do que é costume neste estabelecimento, dou sequência a esta “corrente” da Blogos(fera) onde fui inserido pela mão da Joana Lopes.

Trata-se, pelo que apurei, de uma iniciativa também da Ana Cristina (e por ela experimentada na pastelaria onde medita) e, antes de me convencer a publicá-la, ensaiei-a tendo obtido os resultados anunciados.

Para que o comprovem aqui deixo o desafio aos seguintes 10 vizinhos:

João (Portugal dos Pequeninos), José (Abrupto), Gabriel (Blasfémias), Nuno (Cachimbo de Magritte), Mr. Brown (os Comediantes), Pedro (Delito de Opinião), Miguel (e Deus Criou a Mulher), Nelson (Espumadamente), João (Forte Apache) e ao próprio Pedro no website do PSD.

LNT

Nota: O Miguel do "e Deus..." foi aqui incluido só para desanuviar.
[0.209/2012]

sexta-feira, 13 de abril de 2012

Não concordo mas promulgo

Doces regionaisPara que servirá a tecnicidade de quem se fez eleger com base no conhecimento detido se, depois de eleito, promulga aquilo com que não concorda?

Como essa não-cordância não é política, porque é a sua escola, então refere-se aos efeitos que resultarão das medidas que promulga.

Ou é sádico, ou pouco lúcido.
LNT
[0.208/2012]

Surdinas [ XLIII ]

Mosca(baixinho para que ninguém nos ouça)

O rapaz da vespa fez as contas à vida e concluiu que herdou uns mil milhões para pagar nos próximos anos e que a receita que provocou essa herança foi gasta no jogo do adormecimento.

Agora, tal como faz com as mordomias que usufrui mas de que se descarta, também faz de conta que a explosão que cozinhou foi engendrada pelos madraços que governa.

Ele sabe que cada passo destes é mais uma chumbada no coelho escondido no fundo falso da estatal Segurança Social.
LNT
[0.207/2012]

Sombras

MagritteFico na dúvida se a austeridade se destina a melhorar ou a manter os negócios resistentes a todos os impactos.

Tenho por teoria que, ao contrário do que se ouve vulgarmente nos autocarros, a culpa de tudo isto não é dos Partidos políticos mas sim de um grupo de interesses que gravita por aí e a quem é indiferente os detentores do poder político.

Esse grupo instalado desde sempre consegue que os seus testa-de-ferro flutuem em qualquer mar e, mesmo quando simulam o seu afundamento, é para manobrar mais submersamente os cordelinhos que movimentam. As reformas não passam de uma peça da engrenagem inteligentemente manipulada para eliminar todos os grãos de areia que a fazem patinar.

O que tem mudado nos últimos tempos são as fontes de receita. As sombras sabem o que os políticos não sabem e sabem sobreviver ao trânsito dos políticos.

Pouco lhes interessa a fonte de receita. Tanto lhes faz que jorre pelo aumento de receita ou pela diminuição de despesa. A máquina não é pública nem privada, nem de direita nem de esquerda, nem laranja, rosa, azul ou vermelha. É-lhe indiferente a vida e a morte. Não se importa de pagar desde que possa continuar em movimento.

O resto é espuma que as sombras borbulham para camuflar a sua existência.
LNT
[0.206/2012]