segunda-feira, 7 de maio de 2012

Na minha rua

LisboaNa minha rua existem dois organismos do Estado. Nota-se que as pessoas que neles trabalham passaram a transportar uma marmita com os restos do jantar.

O vai-e-vem que animava a minha rua transformou-se no lá-vai-um.

Na minha rua existem dois cafés. O do Sr. José, com o anúncio na montra a avisar que o Joaquim e o Francisco já não trabalham lá porque o estabelecimento assumiu o aumento do IVA sem o reflectir nos preços e o da Dona Maria, que deixou de fornecer refeições por falta de pessoal.

Na minha rua havia uma papelaria que fechou. Os funcionários da marmita deixaram de comprar o jornal e os empregados dos cafés deixaram de lá entrar.

Na minha rua há uma farmácia onde os avós iam com os netos para se aviarem. A farmácia despediu a Sara e a Sofia porque as receitas do fim do mês não chegavam para os parcos vencimentos que tinham.

Os avós da minha rua já não ficam com os netos. As reformas não aguentam e os pais que trabalhavam no escritório, que entretanto fechou, e no infantário, que tem cada vez menos miúdos, dispensam esse apoio.

Consta que, lá para a Guarda, encerrou a fábrica de peças de automóveis depois da oficina, que havia na minha rua, ter fechado as portas.

Na minha rua já não passa o autocarro porque as pessoas que o apanhavam ficam em casa.

Na minha rua já não se ouvem lamentos piegas. O último foi aquele que o vizinho do 76 proferiu durante o voo que fez do sexto andar.

Na minha rua o silêncio inquieto que sempre antecedeu barulhos violentos só é quebrado pelo ruído das persianas que se abrem para deixar à mostra o anúncio de venda e pelo grito de quem se aventura ao assalto frequente.
LNT
[0.250/2012]

Já fui feliz aqui [ MCXIV ]

Lisboa Docas
Conceição - Tavira - Portugal
LNT
[0.249/2012]

domingo, 6 de maio de 2012

Vive la France

Sarkozy grito
A França deu o primeiro grito para que a Europa volte a ser um lugar aconselhável.

O grito de Sarkozy, um dos casos raros de não reeleição de um presidente da república, tem o sabor de mudança para a esperança.

A partir de hoje abrem-se novos horizontes para a afirmação europeia que voltam a ser caminhos de solidariedade, fraternidade e desenvolvimento e combatem os de empobrecimento de quase todos, a favor da exploração por alguns poucos.

Parabéns a François Hollande. Vamos em frente.
LNT
[0.248/2012]

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Vendo as coisas por esse ângulo...

Canecas Torres Eiffel e de BelémA maior sorte dos portugueses, principalmente daqueles que ficaram em casa a chorar e a repetir que “eles” são todos iguais, em vez de irem votar, foi a de que Sócrates teve de se exilar em Paris para, a partir daí, fazer de conta que não está vivo e a de Coelho ter conseguido, a custo, que Portas entrasse na bolina desta nau sem rota traçada.

Se assim não fosse, provavelmente o José andaria por aí a dar conta do País enquanto que os trabalhadores trabalhavam e pagavam impostos em vez de termos o Pedro e Paulo a darem conta do País mas poupando no trabalho e nos impostos por desocuparem os trabalhadores. Provavelmente os jovens andavam a gastar o nosso dinheiro a oportunizarem-se, a mestrarem-se e a doutorarem-se em vez de emigrarem em busca de sustento. Provavelmente os funcionários públicos continuariam a ter um corte no salário em vez de terem um corte no salário e mais os outros nos 13º e 14º mês. Provavelmente não teríamos a oportunidade de pagar impostos tão altos porque o Presidente da República, em vez de fazer discursos para inglês ver, iria fazer discursos a decretar que há limites para os sacrifícios.

Se Sócrates andasse por aqui, em vez de andar por lá, provavelmente tínhamos o Pedro e o Paulo a continuar a dizer, a partir das bancadas da oposição parlamentar, o contrário de tudo aquilo que estão a fazer e continuávamos sem saber quem era um tal Victor que vivia na Europa central, um tal Álvaro que vivia para as bandas do Alasca, ou uma tal Cristas que vivia por aí mas ninguém dava por ela. O Mota andava de Vespa em vez de Audi e todos nós continuávamos a viver acima das nossas posses em vez de empobrecermos, custe o que custar.

Provavelmente Merkel seria mais feliz por mandar num cábula rabino que a fazia rir, do que num manteigueiro e num cromo que só a fazem chorar.

Ainda bem que a maior parte dos portugueses se deixou ficar a lamentar que “eles” são todos iguais e que, os poucos que o não fizeram, escolheram mandar o Sócrates para longe. Se o não tivessem feito podíamos morrer a rir das partidas e armadilhas que os pasquins lhe montavam enquanto que assim vamos morrer sérios, pobretanas, asseadinhos e tristonhos como compete a um portuguesinho que se preze.
LNT
[0.246/2012]

Já fui feliz aqui [ MCXII ]

Cabanas
Praia da Ilha de Cabanas - Algarve - Portugal
LNT
[0.245/2012]

quarta-feira, 2 de maio de 2012

BPN ou a vida

BPN PorquinhoOiço que vai ser iniciada nova Comissão para branqueamento do caso BPN. Presumo que agora os alvos sejam o Banco de Portugal, a Caixa Geral de Depósitos e outras instituições que nada roubaram.

Quanto ao ladrões, isto é, àqueles que efectivamente roubaram e aos outros que a eles estiveram de alguma forma associados para conseguirem lucros chorudos até hoje nunca esclarecidos, conseguidos através de “favores” e “preferências” até hoje envoltos em neblinas de nascimento múltiplo, adivinha-se que a blindagem da impunidade os continue a bafejar.

As nuvens de poeira confirmam que a desertificação do território nacional continua em passo acelerado.
LNT
[0.244/2012]

Politicamente incorrecto

Pingo AçúcarSobre promoções e outras fajardices de quem já não tem um Pingo de vergonha na cara nem quaisquer baias da ética que antes era apanágio dos merceeiros, pouco tenho a dizer e espero que, quem comprou sabonetes com o dinheiro que deveria ter poupado para os bifes do mês, consiga encontrar, algures, uma receita para confeccionar os sabonetes de cebolada.

Quanto ao resto, nunca tinha visto uma campanha de capa de jornal, tempos infindos de televisão, menção relevante nas redes sociais, ter o impacto que esta teve e, ainda por cima, ao preço da uva mijona. O director de marketing da mercearia merece ser promovido e os consumidores, tal como costumo dizer aos que contribuíram com o seu voto ou com a sua abstenção para eleger este Governo, têm aquilo que merecem.
LNT
[0.243/2012]

Já fui feliz aqui [ MCXI ]

Olhos Maria
Olhos - Lisboa - Portugal
LNT
[0.242/2012]

segunda-feira, 30 de abril de 2012

O 1º de Maio

Primeiro de Maio
Gasparalhinho, moço fino que nem um alho conforme negava afirmativamente a cabeça da senhora professora, era o mais sonso da classe. Traquinas, como não havia outro, Gasparalhinho era conhecido por fazer disparates, uns atrás dos outros e enquanto o diabo esfregava um olho, e sempre que era chamado à lousa para explicar o que fazia de rajada, demorava um tempo infindo para desenvolver. Desconfiava-se que ele fosse gago e que, como não sabia cantar, soletrava as palavras para disfarçar.

Um dia, a professora marcou-lhe um tpc de castigo, em véspera de feriado, que consistia numa redacção sobre o Primeiro de Maio.

Gasparalhinho, arreliado com a calcadela moral que tinha recebido à frente de todos os seus não-amigos da turma, despachou a encomenda com o seguinte texto:

O Primeiro de Maio é o dia que se segue ao dia Trinta de Abril.

Ainda hoje Gasparalhinho, que foi longe por ser fino que nem um alho, continua a asneirar num ápice, a explicar as traquinices muito lentamente e a fazer o mesmo tipo de composições.
LNT
[0.241/2012]

sexta-feira, 27 de abril de 2012

Tralalá

TralalaSei lá o que é Tralalá. Não sei russo nem sequer alemão. Português sei pouco, o suficiente para ir dando novidades daquilo que se faz por aí.

Se querem saber o que é Tralalá perguntem à Helena que anda pelas terras de Merkel a traduzir para português o que é impensável em russo. E, como se não chegasse, refugia-se em estranhos lugares para fazer aquilo que diz serem lançamentos de obra em Portugal.

Fixei que, com entrada livre e depois de autógrafos na Feira do Livro, a trupe se junta na Pensão Amor, coisa "in" vanguardista de Lisboa.

Fica a notícia e, já agora que falei da Feira do Livro, não se esqueçam de que hoje, dia 28, o Porfírio assina o seu “Podemos matar um Sinal de Trânsito?” entre as 15 e as 17 horas, altura em que suspenderá a caneta para dar lugar à de Mário Soares, um pouco mais acima.

Divirtam-se, pois leitura, autógrafos e amores ainda só pagam 23% de IVA.
LNT
[0.240/2012]

Já fui feliz aqui [ MCX ]

Porto Covo
Porto Côvo - Alentejo - Portugal
LNT
[0.239/2012]

quinta-feira, 26 de abril de 2012

CC

Câmara CorporativaGosto de Blogs porque gosto de ler a opinião dos outros. Mesmo quando não concordo, mesmo quando não digo se concordo, entendo ser importante saber o que as direitas, as esquerdas, as assim-assim e as antes pelo contrário pensam e argumentam sobre o dia-a-dia e sobre as animações diárias que afligem ou descansam o pensar português.

Há Blogs que me habituei a ler todos os dias e há outros onde vou ler quando imagino o que lá deve estar escrito. Esses, especialmente, fazem-me falta.

Podia citar muitos, quase todos os que andam pela coluna da direita desta Barbearia, mas hoje fico-me só pela falta que sinto do Câmara Corporativa que, sabe-se lá porquê, deixou há uns dias de cascar nos “estarolas”.
LNT
[0.238/2012]

O discurso do Presidente

Cravo laranjaAtraso-me nesta observação porque nem a tecnologia deixa que seja de forma diferente, nem urge observar. Ainda teremos mais quatro anos para cumprir a obrigação e o castigo. Os poucochinhos portugueses que se deram ao trabalho de sair de casa para escolher quem protocolarmente encerra as sessões comemorativas da liberdade em cada vinte-e-cinco-do-quatro, optaram maioritariamente por um que nunca foi capaz de ostentar um cravo na lapela para dar consistência à ideia de que "os cravos anunciaram um país livre".

Atraso-me nesta observação sem no entanto a querer deixar passar em claro, por ser necessária, embora não urgente, e para que se note o que foi dito no discurso presidencial-festivaleiro para inglês ver
"No passado, soubemos dotar-nos de infraestruturas necessárias e de qualidade, que agora nos destacam positivamente no confronto com outros Estados da União Europeia. Portugal oferece, sem dúvida, condições competitivas para atrair o investimento estrangeiro, como o atestam os êxitos de grandes empresas internacionais."
e relembrar as críticas que, há um ano, levaram o Presidente a acicatar a rua para que não permitisse a continuidade que agora afirma ser o nosso orgulho e a incitar um espírito pirómano consubstanciado na máxima: "Até agora vivemos acima das nossas possibilidades" e "custe o que custar" teremos de retomar o caminho do "empobrecimento" de uns e o "acesso ao pote" de outros.

Por fim, e porque não adianta esgotar todo o assunto dado ainda termos de percorrer este túnel por mais quatro anos atrelados a uma locomotiva que lamenta não ter reforma bastante para o carvão de todos os dias, friso o orgulho e a comoção do Presidente que reconhece que o
"espírito solidário dos Portugueses adquire uma dimensão que nos orgulha e comove. Estabelecem-se redes de solidariedade, o voluntariado cresce, especialmente entre os jovens, o apoio aos mais atingidos pela crise é uma realidade"
deixando ao espírito desse povo, à sua solidariedade e voluntarismo, a protecção social que a Constituição consagra como um direito garantido pelo Estado enquanto está plenamente consciente de
"o desemprego ou a precariedade do emprego jovem, os novos pobres, o encerramento de empresas, os dramas que atingem famílias inteiras, as condições de solidão e de carência que afetam milhares de idosos."
E ainda se admiram quando os Militares de Abril se recusam a ouvir ao vivo e entre salvas de palmas aquilo que Salgueiro Maia definiu, há quase quatro décadas, como "o estado a que chegámos".
LNT
[0.237/2012]