quinta-feira, 19 de junho de 2014

O barbeiro [ X ]

O Barbeiro- Boa tarde Sr. Luís, venho para um aparo de patilhas que está a chegar o tempo de praia e não quero sombras na cara.

- Ora viva, Sr. Jaime, faça a fineza de se acomodar que já lhe faço o serviço.

O Senhor Luis puxou do cabedal de afiar a navalha e deu-lhe duas, três, quatro, chanfalhadas. De seguida passou o papel a testar o corte, mergulhou o pincel na espuma e deu início à função.

- Mestre, não perca a razão por perder a cabeça no afio da navalha. Tenha cuidado com as minhas orelhas, que quem as fez já não está em condições de fazer umas novas.

Com um sorriso, o barbeiro (que adorava quando o tratavam por mestre) deixou a navalha valsar com ritmo e suavidade pela cara do seu cliente porque se apercebeu que se lhe fosse só às patilhas a barba ficaria por fazer. – Tenha calma, amigo! Fique sossegado que só no tempo do meu avô é que os barbeiros também eram sangradores. Aqui, ainda não se usam lâminas descartáveis, mas as navalhas são sempre objecto do maior asseio e de fio irrepreensível, assim como a minha mão que raramente tremelica.

- Sabe que desconfio sempre de tais precisões. É como aquela caldeirada que andam a cozinhar no PS. "Se eles transformarem esta luta numa vendetta, então, se ganharem o Partido (ou o que sobrar dele) perderão o País... Se perderem, seria bom que pudessem sair deste episódio de cabeça erguida e prontos a afirmarem-se como oposição interna, porque as derrotas de hoje são as vitórias de amanhã... Se eu não acredito de todo que AJS possa chegar a PM, não é de todo adquirido que Costa possa por sua vez ganhar as legislativas".

O barbeiro, sempre a sorrir, pegou no paninho quente para lhe acariciar a face e, em sussurro: - Sr. Jaime, Sr. Jaime. Então o senhor não sabe que para haver oposição interna é necessário haver moção, programa, linhas de orientação e os insurrectos ainda não conseguiram mostrar o que quer que seja que seja diferente das linhas de orientação aprovadas pelo poder instituído? É verdade que há muitos beijos, abraços, carinhos e multidões, espingardas e baionetas em riste, mas ideias...

- Acabámos. A sua carinha macia como o rabinho de um bébé. Volte sempre!
LNT
[0.250/2014]
Imagem: http://www.gutenberg.org/

5 comentários:

Jaime Santos disse...

Luís Tito, considero-me esclarecido relativamente à sua posição e agradeço a inclusão na sua divertida historieta. Mas que não pode ser senão ficção. É que eu faço a barba à Gillette, precisamente por causa de um outro barbeiro com a mão menos firme que a do Mestre Luís...

Luís Novaes Tito disse...

;)

Janita disse...

...as barbearias foram sempre locais de grandes sessões de esclarecimento!
Que o diga MST, onde tanto aprendi na barbearia que havia no "Madrugada Suja".

Joaquim O. disse...

Ah, do sebastianismo (Costismo, por estes dias). De mais valia só mesmo, mesmo o messianismo dos Seguristas. E das parábolas com que nos iluminam, a nosotros, homens de excessiva fé em vitórias legislativas e assim...

Luís Novaes Tito disse...

ista, só socialista, mas ainda assim para uma resposta, em boa verdade lhe digo que não me parece que em Seguro haja messianismo, porque os Messias não costumam ser votados.